Frente de consumidores de energia critica interferência política no ONS e na CCEE

Camila Maia

Autor

Camila Maia

Publicado

25/Abr/2024 22:38 BRT

As escolhas para composição do conselho da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) e do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) demonstram interferência do governo federal e do legislativo nessas entidades, que são privadas, segundo nota publicada nesta quinta-feira, 25 de abril, pela Frente Nacional dos Consumidores de Energia. Até a publicação desta reportagem, esta foi a única entidade do setor elétrico a criticar publicamente as eleições desta semana, embora o assunto esteja dominando as conversas desde o início da semana.

Na terça-feira, 23 de abril, os agentes da CCEE elegeram três novos conselheiros e, embora nenhuma das vagas fosse de indicação do governo, houve movimentação do Ministério de Minas e Energia (MME) para emplacar dois dos três nomes, o do engenheiro Ricardo Simabuko e do advogado Vital do Rego Neto - filho do ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Vital do Rego. Foi ainda eleita a advogada Gerusa Magalhães, indicada pelos consumidores e comercializadores de energia.

Hoje, foi a vez da assembleia do ONS. O governo indicou Marcio Rea, atualmente presidente da Emae, como novo diretor-geral da entidade. Além disso, Alexandre Zucarato foi reconduzido na diretoria de Planejamento do ONS para mais quatro anos, enquanto Maurício Renato Souza, chefe do Gabinete do ministro Alexandre Silveira, foi eleito diretor de TI, Relacionamento com Agentes e Assuntos Regulatórios, no lugar de Marcelo Prais.

Ontem, o ministro Alexandre Silveira chegou a confirmar que indicaria Marcio Rea à diretoria-geral do ONS, e afirmou que não indicaria nomes para as outras diretorias, mas confirmou que se questionado sobre determinadas indicações, daria sua opinião.

A pouca experiência de Vital do Rego Neto e de Maurício Renato Souza no setor elétrico foram mal-vistas pelo mercado e, nos bastidores, houve muita reclamação a respeito da interferência do governo. Até mesmo a eleição de Simabuko, profissional respeitado no setor, foi mal-recebida pelo fato do nome ter recebido apoio do governo e do presidente do conselho da CCEE, Alexandre Ramos. Ele entrou na vaga dos geradores, indicado pela Eletronuclear, e disputou a eleição com a ex-conselheira Roseane Santos, que foi indicada pela SPIC.

Oficialmente, contudo, coube à Frente Nacional dos Consumidores de Energia se posicionar de forma crítica às indicações políticas.

"Apesar do discurso de defesa da meritocracia, essa não tem sido a prática empregada na escolha dos responsáveis pela gestão operacional e comercial do Sistema Elétrico Brasileiro", diz a nota da entidade, que reúne diversas associações ligadas a consumidores de energia, conselhos de consumidores e institutos independentes.

Na nota, a entidade denunciou "candidaturas súbitas, parentes de autoridades, assessores de ministros, nomes nem sempre com a necessária experiência para ocupar os cargos para os quais estão sendo nomeados", e disse que os vínculos políticos envolvidos com as indicações comprometem a independência e a atuação técnica que se espera das instituições.

Outra voz que se manifestou publicamente, a advogada Elena Landau publicou um texto em sua conta no Linkedin após a eleição na CCEE criticando a assembleia. "Minhas críticas não são aos nomes, mas ao processo", explicou ela à MegaWhat.

As principais críticas do setor - não publicadas em canais oficiais - foram destinadas a Vital do Rego Neto, já que a vaga era das distribuidoras, segmento que está no centro de várias crises neste ano, enquanto aguarda a definição das regras das prorrogações das suas concessões. O advogado, que foi oficialmente indicado pela Cemig, cumpre os requisitos de experiência no setor, já que atuou em empresas do setor e foi assessor da diretoria-geral da Aneel entre 2020 e 2022, e foi o único indicado pelo segmento de distribuição. O atual representante das empresas no conselho da CCEE, Marco Delgado, poderia ser reconduzido a mais um mandato de quatro anos. 

"A assembleia poderia ter negado os nomes, votado contra, mas aprovou, então fica difícil fazer algo", disse uma fonte que preferiu não se manifestar para evitar ser mal interpretada.

A carta da Frente Nacional dos Consumidores de Energia afirmou ainda que embora a governança da CCEE e do ONS, duas entidades privadas, delegue aos agentes de mercado as indicações, "o que constatamos é a abdicação por esses agentes de sua competência e responsabilidade nesses processos, para depois, 'em off', responsabilizar o governo federal".