TCU pede análise do Ministério da Fazenda sobre "gravidade" de déficit de pessoal na ANP

Poliana Souto

Autor

Poliana Souto

Publicado

29/Abr/2024 13:26 BRT

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Óleo e Gás

O Tribunal de Contas da União (TCU) encaminhou um pedido de análise ao Ministério da Fazenda para verificar o nível de “gravidade” do déficit de pessoal na Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Em seu relatório, a corte afirma que, ao longo desses três anos da Lei 14.134, conhecida como a Nova Lei do Gás, a falta de profissionais foi apontada pela agência como um de seus principais problemas para a realização de atribuições que lhe foram imputadas pela nova legislação, prejudicando o desenvolvimento do mercado de gás natural no país.

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Em ofício ao Tribunal, a autarquia afirmou ter passado por processos de Dimensionamento da Força de Trabalho (DFT), nos quais foram identificados que a quantidade de servidores era inferior à necessária em praticamente todas as suas atividades. Os dados apurados em 2021 apontavam para o déficit de 353 profissionais na ANP. Entretanto, a agência afirma que o número de cargos efetivos vagos aumenta anualmente, devido a aposentadorias, falecimentos e exonerações sem a contrapartida da contratação de novos servidores.

A falta de profissionais tem postergado os prazos para cumprimento de suas atribuições, segundo a ANP. Ao TCU, a agência destacou que a transição para abertura do mercado de gás natural é um processo que leva “tipicamente” quatro anos para ocorrer, mas que dificuldades estão sendo enfrentadas para o cumprindo das novas atribuições previstas em lei, como a promoção de novas chamadas públicas para contratação de capacidade de gasodutos; a atuação em relação a conflitos no acesso às infraestruturas; necessidade de se posicionar em relação a várias atividades que até então eram concentradas na Petrobras; e a fiscalização e o monitoramento do mercado à medida que as pressões concorrenciais se fizerem presentes.

De acordo com a agência, o seu Centro de Monitoramento da Gás Natural também vem sendo prejudicado e muitas atividades não estavam sendo realizadas ou eram de forma incompleta, tais como: a fiscalização da plataforma eletrônica de oferecimento da capacidade de transporte, a fiscalização do uso eficiente dos sistemas de transporte e a análise e o monitoramento, com periodicidade horária e diária, da movimentação nas instalações de entrada e saída de gás na rede nacional de gasodutos de transporte; a análise de processos de outorga de autorizações, as fiscalizações e o acompanhamento de incidentes ficam a cargo das mesmas pessoas por falta de quantitativo adequado. Também foram apontados atrasos no cumprimento de sua agenda regulatória,

Com esse cenário, a ANP disse ao TCU que “tem se esforçado continuamente para mitigar a escassez de pessoal”. Para reduzir os atrasos e cumprir suas tarefas, a agência afirma que movimentou alguns servidores de carreiras descentralizadas do Ministério do Planejamento e de outras instituições, além de realizar uma movimentação interna de pessoal. Também foi solicitada a contratação temporária de 104 servidores ao todo, sendo 35 para atuarem na Superintendência de Infraestrutura e Movimentação (SIM), e na qual recebeu autorização para publicar, em junho de 2022, edital para a contratação temporária de apenas 48 profissionais de atividade superior.

A ANP relata ainda que tem solicitado, ano após ano, autorização para realização de concurso público para o provimento de 120 cargos efetivos, sendo 53 deles para especialistas em Regulação, porém sem sucesso. O último concurso autorizado pelo Ministério da Economia (atual Ministério da Fazenda) foi realizado em 2015.

“A escassez afeta não somente a SIM e a regulação do gás natural, visto que áreas não menos importantes, como a que trata de royalties e participações governamentais, também sofre com a falta de pessoal”, disse a ANP ao TCU.

O Tribunal também apontou que, ao realizar a análise das versões da agenda regulatória da ANP dos últimos anos, verificou prorrogações recorrentes que somadas chegam a até quatro anos na data prevista de conclusão de algumas ações regulatórias relativas ao gás natural.

“Apesar da realização do concurso para contratação de temporários, a quantidade de servidores contratada, frente ao déficit calculado no DFT, certamente não é suficiente para o atendimento adequado da extensa demanda por atividades de regulação. Sendo assim, propõe-se o encaminhamento desse relatório ao Ministério da Fazenda, a fim de dar ciência da gravidade da situação de escassez de pessoal na ANP e dos severos impactos no cumprimento tempestivo de sua Agenda Regulatória e no desenvolvimento do mercado de gás natural brasileiro”, diz o ministro Walton Alencar Rodrigues, relator do processo, em seu voto.

Últimos três anos

Por fim, o TCU também fala sobre a reinjeção de gás natural e o papel da Petrobras no processo. Em suas projeções para o horizonte até 2030, a estatal aponta que o volume de gás natural a ser reinjetado representará cerca de metade do total que deverá ser produzido nesse período. Segundo afirmou a Petrobras ao TCU, as razões que levam à prática destes níveis de reinjeção são: o alto teor de contaminantes (principalmente CO2); a necessidade de manutenção da pressão no reservatório; e o aumento da recuperação final do petróleo.

Contudo, em ofício ao TCU, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) rebate a necessidade de reinjeção do combustível, afirmando que haveria volume de 25 milhões de m³/dia de gás natural passível de ser disponibilizado ao mercado caso houvesse viabilidade de exportação.

Na avaliação do TCU, houve redução da participação da Petrobras em diversos setores enquanto cresceu o número de comercializadores autorizados pela ANP a operar na malha integrada, no número de carregadores autorizados e na quantidade de contratos vigentes com consumidores livres. Segundo o TCU, tal avanço está concentrado na região Nordeste do país, enquanto as demais regiões “foram pouco beneficiadas pelo processo de abertura”.

A equipe de fiscalização da corte também pontou que uma das questões que dificultavam o livre mercado de gás natural tem sido o monopólio das distribuidoras estaduais, que avançaram “considerável” no número de contratos de consumidores livres, desde 2017. De acordo com a área, há uma disparidade entre os estados da federação, no que se refere à regulação do consumidor livre e ao acesso à rede nacional de comercialização de gás natural.